Sábado , 26 de Março DE 2011

A culpa é da Primavera

A viagem parecera-lhe uma eternidade mas finalmente aterrara. Passou todos os controles em passo apressado e rezava para que não a mandassem parar. Não que tivesse algo ilegal com ela mas apenas porque tinha pressa. Por muito que corresse sentia que andava em câmara lenta. Avançou o mais rápido que conseguia andar arrastando atrás de si a bagagem. Hoje não se preocupava com o que trazia vestido, com penteados alinhados ou com maquilhagens retocadas. Pensando bem preocupava-se cada vez menos com isso. Antecipam-se vontades nas saudades sentidas.

 

Como vem sendo hábito permitam que meta o bedelho e interrompa a história por um momento. Se bem se recordam um dia proibiram-nos de escrever histórias de amor e no dia seguinte pediram-nos acção. A nossa personagem principal ficou estendida numa rua de Lisboa após sentir uma pancada na cabeça. Continua-se a história com tema de primavera e deslinda-se o mistério de tal ataque.

 

O mundo distancia-se enquanto os corpos se unem. Despedem-se os preconceitos e apresentam-se os desejos. Gosta-se de toques fortuitos que fazem com que os corpos estremeçam em uníssono. Sussurram-se vontades enquanto se partilham olhares. Olham-se nos olhos. Sempre nos olhos. Sentem-se perto, cada vez mais perto. Abraçam-se no prazer e sentem-se no querer. Querem-se e soltam-se cada vez mais. Alterna-se entre quereres e risos sentidos. Mais do que se sentirem um no outro sentem-se um do outro. Gosta do silêncio enquanto se deixa abraçar.

 

Murmura. Pede que a deixe dormir. Ouve vozes á sua volta. Demasiadas vozes. Sente-se confusa. Sente-se perdida no tempo enquanto as vozes sobem de tom. Tenta localizar-se. Voara para o ver. Devoraram-se na pressa da saudade e adormecera saciada. Tenta sentir-lhe o corpo e o cheiro mas está fria. Sente frio. Pedem-lhe que tenha calma enquanto a deslocam para outro local. Ouve o som de ambulâncias e deixa-se ir. Está cansada. Sente-se cansada.

 

Interessante a forma como o tempo passa sempre que estão juntos. Esqueçam-se horários comuns e adoptem-se horários pretendidos. Gosta de deitar a cabeça no seu colo enquanto ele lhe mexe no cabelo. Este ano comemoram a entrada da primavera com um piquenique. Incontáveis os gostos de ti, os abraços e os beijos. Impressionante o que sente quando ele a beija nos olhos. Indiscutível o carinho que estes dois transmitem. Diz-lhe que sente sono e adormece enquanto ele lhe faz festas na cabeça.

 

De certo começam os caros leitores a estarem impacientes. Alternamos entre acordares e adormeceres, misturamos desejos carnais e lamechices pelo meio mas ainda não sabemos o que aconteceu a Cristina. Chamemos-lhe assim porque daqui para a frente é importante que tenhamos um nome. Apresso-me nas letras e voltemos à história que até eu estou a ficar curiosa.

 

“D. Cristina sou a enfermeira Madalena está-me a ouvir?”. Abre os olhos, confusa, enquanto tenta perceber onde está. Vê ao seu lado as suas vizinhas do primeiro andar e pergunta-se porque estarão ali. Contam-lhe que está há dois dias no hospital. Pergunta o que aconteceu enquanto se tenta lembrar de alguma coisa. Dizem-lhe que levara com o vaso da Dona Eulália na cabeça. Que a pobre senhora estava a mudar as plantas de vaso, para celebrar a primavera, à varanda quando um dos vasos caiu. Contaram-lhe, ainda que quem lhe valeu tinha sido o Senhor Inácio que nesse preciso momento ensaiava a sua actuação para a próxima selecção dos Ídolos. Recorda-se finalmente dos gritos que ouviu, da decisão que tomou em ir em seu auxílio e do cheiro a flores que tinha sentido.

 

Senta-se apressada na cama. Lembra-se dele. Tinha de o avisar. Devia estar preocupado. Pede para que lhe cheguem o telefone que precisa de fazer uma chamada. “Querem ver que a bela adormecida acordou antes de levar um beijo do príncipe?” ouve atrás de si. Despedem-se as vizinhas de forma acelerada enquanto se acotovelam entre sorrisos derretidos. Incrível como ele seduz todos á sua volta. Até as jararacas das vizinhas tinham ficado rendidas.

 

Olha-o enquanto ele lhe conta como ficou preocupado por não ter recebido a sms da noite. Conta-lhe que ligou e que alguém atendeu o telefone. Diz-lhe que esteve sempre ao seu lado e que este ano tinham falhado o piquenique de inicio de primavera. No decorrer da conversa pergunta-lhe:

 

- Olha lá ,o que é que andavas a fazer pela rua descalça e com uma lima de unhas na mão?

 

Ri-se e promete-lhe contar tudo um dia. Pensa no que viveu durante o tempo em que esteve inconsciente e equaciona se terá sido mesmo um sonho. Abraça-o e diz-lhe o quanto o ama. Ele diz-lhe que quer que ela seja a mulher que nunca teve.

 

Paremos com tanta “melice” que até corremos o risco de enjoar. Até porque haverá quem ache o amor lindo e os que não acreditam nele. Por aqui insistimos no amor, no humor e no romance porque por aqui acreditamos que sem eles não faz sentido. Culpa-se a primavera de tal transtorno e enquanto os dois se beijam esperamos pelo desafio que se segue.

 

Marta

 

Historia de Ficção escrita por mim para a Fábrica de historias

publicado por Marta às 19:49
Quarta-feira , 09 de Março DE 2011

Esta não é Uma História de Amor

Risque-se o amor das letras. Apague-se príncipes e princesas. Palavras de romance estão proibidas mas a história vai continuar. Pedem-nos palavras novas, ideias novas e vontades novas. Equacionam-se temas possíveis e sorrimos na primeira reflexão. Oxalá fosse tão fácil definir tudo o resto. Fale-se então de tudo menos de amor.

 

Sobe a rua do Carmo. Vê o reflexo numa montra e distrai-se com os artistas de rua. Sorri enquanto actuam. Uns cêntimos só uns cêntimos ouve pedir-lhe. Abana a cabeça num não impensado e desarma-se com um “muito obrigada que só esse sorriso já valeu a pena”. Recorda-se de Portobello Market em especial de um artista que adorava ouvir tocar. Promete-se lá voltar. Ajeita o cabelo  que teima em soltar-se e sente o cheiro de castanhas a assar.

 

Se se falasse de amor estava na hora de um ele entrar. Certamente cruzariam olhares e fixar-se-iam num flirt mais ou menos velado. Mas não. Aqui fala-se de uma ela que passeia pelas ruas de Lisboa. Ela e os seus pensamentos.

 

Pensa na quantidade de pessoas à sua volta. Recorda-se dos tempos em que fazia aquele caminho todos os dias. Interessante. Veio-lhe à memória o incêndio do Chiado. Olha à volta e apercebe-se do que foi feito. Aprecia as floreiras nas janelas. Gosta do Chiado. Pensando bem sempre gostou do Chiado. Senta-se na esplanada da Brasileira lado a lado com Fernando Pessoa. Pensa nos seus heterónimos e pergunta-se o porquê de não lhes terem erguido, também a eles, uma estátua.

 

Pede o café da praxe. Pousa o livro na cadeira do lado. Não percebe porque continua a trazer um livro se o que lhe interessa verdadeiramente são as pessoas. Gosta de observar as pessoas. Viaja novamente. Desta feita estamos na Praça da Cidade Velha em Praga. Perde-se em imagens soltas. Denunciam-na as risadas e regressa aos olhares dos que estão sentados por perto.

 

Encanta-se com os que tocam á sua frente. Abana o corpo ao ritmo dos instrumentos. Sorri mais uma vez e perde-se no gesto ao lado. Estranham-se gestos diferentes. Pensa-se em sexos e em géneros e recua até ao Paraíso. Como seria o dia-a-dia de Eva e de Adão? Pergunta-se.

 

Faça-se um parêntese e acalmem-se os leitores. Não se fala de romance mas a história honra a moral e os bons costumes. Adão e Eva estão cobertos por uma parra. A única orgia que poderá existir é a de letras. Orgasmos e clímax apenas nas ideias. Avancemos então para a nossa protagonista que se bem se lembram estava  entre o Chiado e o Paraíso.

 

Reconhece a importância das lutas pela igualdade das mulheres. Mas derrete-se num gesto cavalheiro. Revolta-se contra as desigualdades de oportunidades. No entanto, não abdica de um deixar passar na frente. Indigna-se com diferenças salariais. Não resiste a um puxar de cadeira. Sente-se tonta com tais pensamentos alternados. Chama o empregado e pede-lhe uma água.

 

Observa os que caminham. Apressam-se uns e detêm-se outros. Falam-se línguas diferentes. Sobem e descem num vai e vem constante. Vê casais diferentes. Sorri na coragem aplaudindo a vontade. Esconde-se nos Prada. Mais fácil assim. Não gosta que a olhem porque não gosta que a leiam. Sempre foi assim mas não sabe se sempre assim será.

 

Cai a noite em Lisboa. Solta-se o vento de Janeiro. Perdeu-se no tempo de um dia sem tempo. Preocupam-na as diferenças de género mas resolve-se a esquecer a Anatomia, Biologia, Psicologia e afins.  Caminha em direcção ao miradouro. Gosta da vista de cidade iluminada. Perde-se no postal vivo. Recua-se a outros tempos e suspiram-se todas as promessas que ficaram por cumprir.

 

Desce no passeio contrário ao que subiu. Abriga-se da chuva que teima em cair. Choca nos que se preparam para a noite de Lisboa e sente-se novamente adolescente. Pergunta-se as vezes que terá caminhado por ali. Procura caras e situações. Fácil perder pessoas no nosso tempo mas mais fácil ainda manter amizades. Apressa-se na vontade de uns braços que a esperam para a abraçar. Perde-se na multidão que circula e ruma aquilo que prometemos não falar.

Marta

 

Texto Fictício escrito por mim para a Fábrica das Histórias

publicado por Marta às 00:59
Terça-feira , 31 de Agosto DE 2010

Amor Fora de Prazo

 

 

Inconstante a forma com o te olhava ultimamente, oscilando entre o amor e o ódio, entre o altruísmo e a cobrança, entre o desejo e a vontade, agora que caí em mim posso até dizer que te olhava com olhos de amor e coração em ódio ou será que era ao contrário? Se fores sincero sabes que é verdade, posso até apostar que sentias o mesmo. Sei que um dia sentia ser tudo para ti e no outro sentia que era menos que nada. Outro acordava apaixonada e noutros não te podia sequer ouvir.

 

Esfumou-se o amor entre decisões precipitadas e indecisões confirmadas, esfumou-se o amor entre promessas quebradas e vontades desiludidas. Quebram-se segredos cobram-se desejos que se misturam entre o meu e o teu quando deveriam ter sido desde inicio nossos. Falhámos ambos num conceito quando deveríamos termos, apenas, vivido momentos.

 

Entre raivas sentidas e sonhos desfeitos questionam-se veracidades de sentimentos quando se deveriam questionar veracidade de vontades. Entre lágrimas que não se sabe provirem de rios de nuvens de sonhos se de raiva ou de vingança colocam-se dúvidas sobre a veracidade dos factos, duvida-se de se ter sentido ou mesmo de se ter vivido.

 

Pensam-nos vitimas um do outro quando afinal somos vítimas de nós próprios. Procuramos culpas exteriores quando devíamos procurar perdões interiores. Acusamo-nos mutuamente sem nunca assumirmos a nossa percentagem de amor mal confeccionado, de dúvidas exageradas ou mesmo de certezas que nunca o foram.  

 

De repente percebo que nos esquecemos de olhares cúmplices, toques furtivos, sussurros velados que rapidamente se transformaram em corações em palpitação, em palavras cheias de significados, em beijos únicos e abraços de conforto. Esquecemo-nos de momentos em que nos entrelaçámos e fomos um do outro ou mesmo um e outro. Esquecemos que um dia fomos com a preocupação que temos em pensar no que poderíamos vir a ser.

 

Perguntas-me “O que aconteceu ao nosso amor?” Eu limito-me a responder que “ Acredito que ficou fora de prazo”

 

 

Marta leal

(Texto de ficção - 31/08/2010)

 

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publicado por Marta às 10:56
Terça-feira , 09 de Março DE 2010

Eu também tenho um feeling

Que os olhares dizem mais que mil palavras, que os gestos valem mais que todas as explicações e que o valor das coisas deixou de fazer sentido quando tenho o valor dos momentos.

 

Que chegaste da forma certa e com a atitude ideal, que me conquistas-te antes de eu perceber que podia ser conquistada, que me deste sem ser necessário pedir, que és sem que eu tenha de pedir que o sejas.

 

Eu? Quero continuar no nosso abraço aquele que é eterno e que um dia aceitei dar-te. Eu? Quero-te simplesmente por seres quem és.

 

publicado por Marta às 00:08

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