Personalidade (s)

Saio da conferência com a noção de que existem mentes brilhantes. Penso como deverá ser fascinante desenvolver esta ou aquela investigação e conseguir que a espécie humana evolua mais um pouco apenas por um trabalho que é meu. Penso em todos que ao longo deste processo de evolução da nossa espécie se dedicaram a estudos, combateram dogmas e provaram factos. Penso em todos que ano após ano se esforçaram, para que um dia o conhecimento e a compreensão sobre quem somos chegasse a um hoje com menos dúvidas.

 

A pergunta sobre a personalidade portuguesa que mais admiro ficou-me na cabeça. Entro no táxi e quase automaticamente vou vendo rostos e feitos enquanto tendo definir uma ordem de importância. Classifico-os um a um. Faço-o não apenas pela área em que se destacaram mas também pela forma de estar, ser e mesmo visibilidade pública. Penso na dificuldade que será atribuir prémios para este ou aquele feito. Imagino-me entre o júri dos prémios Nobel. Não deixo de sorrir perante uma mente fértil e uma criatividade sem limites que possuo e sem a qual não sei viver.

 

O trânsito está caótico e as pessoas correm apressadas debaixo de uma chuva que insiste em cair. Reparo na diversidade de fisionomias, nos passos mais ou menos apressados. Na generalidade dos casos são rostos tristes alheados do que os rodeia. Uns caminham sozinhos outros caminham com eles próprios. Cruzam-se sem se ver, contornam-se como se fossem objectos e seguem simplesmente em frente. Rostos !!! Apenas rostos.

 

Pergunto-me de onde virão e para onde caminham. Tento adivinhar vontades e escrutinar sonhos se é que existem sonhos. Tento mas não consigo. Impossível entrar na cabeça de todos, imaginar vidas cujas realidades eu desconheço. Impossível imaginar meios envolventes de rostos sem expressão. Impossível imaginar vidas de rostos que parecem apenas querer sobreviver quando era suposto viver.

 

Olho-os, mais uma vez, enquanto o carro arranca. A pergunta que fiz a mim mesmo encontra finalmente uma resposta. Não posso admirar apenas uma Personalidade Portuguesa. Impossível premiar alguém quando os outros travam uma luta diária entre empregos, transportes, horários, filhos e sobrevivência. Impossível premiar alguém quando há quem tenha deixado de sonhar para conseguir lutar. Impossível premiar alguém quando há tantos a quem as asas foram cortadas face a uma realidade dura e quase sem futuro.

 

Impossível premiar alguém quando existem anónimos a sobreviver quando deviam viver. Impossível designar alguém quando os que admiro são aqueles, os anónimos,  que dia após dia vão construindo vidas perante uma adversidade de elementos. Impossível designar alguém quando, no fundo, me limito a admirar tantos. 

publicado por Marta às 09:14